
STJ/Tema 1.018. Relativização da DER. STJ/Tema 995.
A jurisprudência em destaque desta quinzena envolve um tema que divide opiniões entre os juristas. Trata-se do Tema Repetitivo 1.018, apreciado pelo Superior Tribunal de Justiça em 2022.
De maneira bem resumida, entendeu-se o seguinte: se, no curso do processo judicial, o segurado tem deferido benefício administrativamente mais vantajoso do que aquele obtido na demanda judicial, terá ele o direito de permanecer com o benefício mais vantajoso (administrativo), sem prejuízo da execução das prestações atrasadas do benefício reconhecido judicialmente.
No entanto, caso o reconhecimento do benefício judicial esteja condicionado à reafirmação da DER para um período posterior ao término do processo administrativo, seria viável a aplicação dos fundamentos determinantes do Tema nº 1.018?
É sobre isso que falaremos!
Lembrando que nosso objetivo não é dar respostas exatas, mas provocá-los a pensar sobre as implicações dos precedentes qualificados julgados pelas cortes de uniformização.
Para entendermos as implicações do Tema n.º 1.018 na reafirmação da DER – igualmente abordado pelo STJ no Tema n.º 995 – é crucial analisarmos as proposições fático-jurídicas relacionados ao Repetitivo.
No caso, o segurado havia ajuizado uma demanda judicial em 2016 para questionar o indeferimento de um benefício requerido em 2012; posteriormente, no curso da ação, o segurado obteve administrativamente o deferimento de aposentadoria, usufruída ao longo de todo o processo judicial; por fim, a demanda foi acolhida pelo Judiciário para reconhecer o direito ao benefício desde 2012.
Ocorre que na fase de cumprimento de sentença identificou-se que a RMA (renda mensal atual) da aposentadoria judicial era inferior ao benefício concedido administrativamente.
Com base nesse contexto fático, o segurado almejou o recebimento dos atrasados da aposentadoria “judicial” até o início da aposentadoria “administrativa”.
Sob o ponto de vista jurídico, a Corte inicialmente concordou que o caso concreto não se assemelhava ao Tema de Repercussão Geral nº 503, em que o Supremo Tribunal Federal tratou sobre o fenômeno da “desaposentação”.
A análise dos votos também revela que a rejeição do primeiro requerimento foi considerada uma violação aos direitos do segurado, visto que houve a recusa de um direito já incorporado ao seu patrimônio jurídico, obrigando-o a permanecer trabalhando devido à negativa indevida.
Foi possível notar, ainda, o uso da expressão compensação de dano, em reforço à antijuridicidade da conduta perpetrada pelo INSS ao indeferir equivocadamente o benefício inicialmente requerido pelo segurado.
A partir de tudo o que foi relatado, é possível estabelecer o seguinte elemento essencial: a existência de uma negativa indevida por parte do INSS por ocasião da análise do processo administrativo, que resultou numa situação de injustiça para o segurado (ter que continuar trabalhando).
Fixado esse ponto, o próximo passo consiste em olhar para um caso em que houve relativização judicial da DER (STJ/Tema 995), a fim de investigar a presença das razões necessárias e suficientes que justificaram o Tema 1.018.
Para tanto, imaginemos como exemplo uma segurada que pediu a aposentadoria em 01/2014 e em 01/2015 é informada pelo INSS sobre o indeferimento; em 01/2016 ajuíza uma demanda questionando a negativa administrativa; em 01/2019, no curso da ação, obtém administrativamente uma nova aposentadoria e; por fim, em 01/2020, sagra-se parcialmente vencedora na demanda judicial, sendo reconhecido o direito ao benefício mediante a relativização da DER até 01/2017. A sucessão de acontecimentos pode ser representada pela linha do tempo abaixo:

Deflagrado o cumprimento de sentença, identifica-se que o benefício administrativo, concedido em 01/2019, possui uma RMI mais vantajosa do que aquela alcançada em 01/2017.
Bom, chegamos ao impasse por trás da nossa jurisprudência em destaque: afinal, poderíamos cogitar a aplicação dos fundamentos determinantes do STJ/Tema 1.018 no caso em tela?
Para finalmente respondermos essa pergunta é preciso aferir se existe alguma congruência entre as proposições fático-jurídicas do Tema e a questão pendente de solução.
No caso paradigma, o fator elementar que impulsionou a solução conferida pelo STJ foi a existência de uma negativa indevida por parte do INSS, cujo efeito prático foi obrigar o segurado a continuar trabalhando a despeito da aposentadoria já fazer parte de seu patrimônio jurídico.
Contudo, no caso pendente de solução, não se verifica a existência desse mesmo elemento, pois quando postulou o benefício, em 01/2014, ou até mesmo quando a análise administrativa foi finalizada (01/2015), a segurada não reunia todos os requisitos para se aposentar. A incorporação do direito à prestação previdenciária só ocorreu em 01/2017, mediante a relativização da DER.
Logo, é adequado afirmar que a negativa por parte do INSS se mostrou devida, diferentemente do caso concreto que alicerçou o Tema 1.018. Além disso, quando o Superior Tribunal de Justiça firmou referido precedente não se discutiu o fenômeno da relativização da DER, sendo este um fato relevante que não foi considerado anteriormente.
Verifica-se, portanto, uma distinção de elementos essenciais, como também a existência de um fato relevante (reafirmação da DER) que não foi considerado pelo STJ/Tema 1.018, circunstâncias que sugerem a impossibilidade de se aplicar a ratio decidendi do Tema no caso hipotético.
Porém, como o Direito não é uma arte absoluta, é possível identificar na jurisprudência decisões aplicando o STJ/Tema 1.018 concomitantemente com o STJ/Tema 995, como ocorreu no Agravo de Instrumento n.º 5014824-84.2024.4.04.0000, relatado pelo Desembargador Federal Márcio Antônio Rocha em 12/09/2024, bem como de decisões afastando a aplicação simultânea dos temas, como na Apelação Cível nº 5006236-33.2017.4.04.7114, relatado pela Desembargadora Federal Eliana Paggiarin Marinho, em 14/07/2024.
Mas, e se a relativização da DER ocorrer ainda no curso do processo administrativo, cogitar-se-ia a incidência do Tema 1.018? Esse será o tema da próxima jurisprudência em destaque.